A relação entre a comunicação comercial e o consumo de bebidas
O consumo de álcool no país é uma das maiores preocupações que os pesquisadores e pais têm em comum. Isso porque tem havido um crescimento no consumo de bebidas alcoólicas entre os mais jovens, potencializado também com a  pandemia de Covid-19, associado a quadros de ansiedade graves por conta do isolamento social.
Estudiosos afirmam que a propaganda de bebidas alcoólicas contribui para a ampla aceitabilidade social das bebidas alcoólicas e, desse modo, influencia tanto no primeiro uso quanto no uso continuado dessa substância. O consenso ainda é incerto, uma vez que os estudos divergem sobre o tema. Enquanto alguns apontam para uma pequena influência das propagandas sobre as vendas e o consumo de bebidas alcoólicas, com um possível efeito acumulativo que ocorre com o tempo e à exposição, outros indicam a inexistência de qualquer relação entre propaganda e o comportamento do consumo de álcool.
O Brasil está entre os líderes no ranking de números de anos perdidos de vida saudável. Entre a população brasileira que bebe, 33% já relataram ter abusado do álcool em algum momento. A taxa corresponde a mais que o dobro da média mundial, de 16%, mesmo com as restrições impostas pela Lei n° 9.294, de 15 de julho de 1996, para a propaganda de bebidas alcoólicas, restringindo os horários de veiculação e suas formas de representação.
As restrições previstas em lei, por mais necessárias que possam ser, deixam de lado as bebidas alcoólicas mais consumidas no país, as cervejas, uma vez que, para os efeitos da lei, somente são consideradas alcoólicas aquelas bebidas com teor de álcool superior a 13º Gay-Lussac. Boa parte das cervejas disponíveis no mercado brasileiro sequer chega aos 5%.
É importante ressaltar que as restrições legais na publicidade de alcoólicos são baseadas somente na constituição atual, que desconsidera como bebida alcoólica produtos que possuem menos de 13% de álcool na composição. É nesse ponto que o CONAR e seu Código entram em cena.
O CONAR e a publicidade de alcoólicos
Buscando promover um ambiente publicitário mais saudável, justo e ético, o Conselho de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) estipula, no Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, as diretrizes para a propagação de comerciais de bebidas alcoólicas. Diretrizes estas que vão ao encontro das leis, atuando como um reforço das normativas já previstas na Constituição e dando um norteamento para a publicidade de bebidas que não se enquadrem na definição legal.
No Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, está disposto: "considera-se bebida alcoólica, para os efeitos da ética publicitária, aquela que como tal for classificada perante as normas e regulamentos oficiais a que se subordina o seu licenciamento". O Código, no entanto, determina a distinção entre três categorias de bebidas alcoólicas mais comumente consumidas: as cervejas e os vinhos, as bebidas alcoólicas provenientes de destilação, fermentação e/ou retificação e a bebida alcoólica fornecida em mistura com água, suco ou refrigerante, as ices, por exemplo. Cada uma dessas categorias recebe seu próprio anexo com as normativas.
Em 2013, o CONAR atualizou seu código e incluiu a proibição de que a publicidade de álcool utilize animais “humanizados”, bonecos ou animações que possam despertar a curiosidade ou a atenção de crianças, em função dos questionamentos acerca de peças que contavam com animações de tartaruga e siri para vender cerveja. Também proibiu que pessoas com – ou com aparência de – menos de 25 anos apareçam na publicidade de bebidas alcoólicas.
Tentativas de mudanças na Legislação
Diante da distinção de bebidas alcoólicas feita na Constituição, o Ministério Público do Estado de São Paulo chegou a propor, em 2013, uma ampla mobilização da sociedade acerca do impasse da cerveja ser ou não considerada bebida alcoólica perante a lei.
Intitulada "Cerveja Também é Álcool" a campanha propunha a alteração do parágrafo único do artigo 1º da Lei Federal 9.294/96 para que as restrições à publicidade passem a abranger toda e qualquer bebida, com graduação alcoólica igual ou superior a 0,5º Gay-Lussac, tendo por base a definição técnica do Decreto 6.117/2007, que institui a Política Nacional sobre o Álcool.
No fim de 2014, a Justiça Federal deu uma decisão favorável à restrição de publicidade de bebidas de teor alcoólico igual ou superior a 0,5º Gay-Lussac, sob a ideia de proteger crianças e adolescentes e compreendendo o direito constitucional à vida e à saúde, bem como a prioridade absoluta das políticas relacionadas à infância. No ano seguinte, após o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitar estender as limitações à publicidade de bebidas com teor alcoólico superior a 13º, o órgão também anulou decisões judiciais anteriores que restringiam a publicidade de cervejas.